Seja na aula de spinning, de musculação, nas oficinas de teatro ou no
trato com as crianças no trabalho como professora, Débora Araújo Seabra de
Moura, de 31 anos, prova que a inclusão é possível. Moradora de Natal (RN), ela estudou exclusivamente na rede
regular de ensino, e foi a primeira pessoa com síndrome de Down a se formar no
magistério, em nível médio, no Brasil, em 2005. Fez estágio na Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp) e há nove anos trabalha como professora
assistente em um colégio particular tradicional de Natal, a Escola Doméstica.
Débora considera que sua vida escolar teve mais experiências positivas.
“A escola regular me fez sentir incluída com as outras crianças. Para mim não
existe separação. Superei preconceitos, fiz muitas amizades e mostrei para as
pessoas o que era a inclusão”, afirma.
Neste ano, a missão da jovem na Escola Doméstica é ajudar a cuidar e
alfabetizar uma sala com 28 crianças de 6 a 7 anos do 1º ano do ensino
fundamental. “Eu gosto das crianças. Tenho paciência, só alguns são bagunceiros
e a maioria é focado. Se eu sou brava? Não, sou normal, trato eles super bem”,
diz.
"Nunca
cogitei uma escola especial porque Débora era uma criança comum. A escola
especial era discriminatória e ela precisava de desafios. Não sabia muito bem
como seria, mas estava aberta para ajudar minha filha a encarar qualquer
coisa"
Margarida Seabra, 71 anos, advogada
A professora diz que foi muito bem recebida pelos funcionários,
professores e alunos da escola que de vez em quando a questionam sobre as
diferenças. “Às vezes as crianças me perguntam: ‘Tia por que você fala assim?’.
Aí eu respondo: ‘Minha fala é essa, cada um fala de um jeito, de forma
diferente’. Aproveito e explico que tenho síndrome Down e eles entendem."
Desinformação
Há 31 anos quando Débora nasceu pouco se sabia sobre a
síndrome de Down. Na época, as crianças que têm olhos amendoados e podem ter
habilidade cognitiva comprometida por conta presença do cromossomo 21 eram
chamadas de maneira pejorativa de ‘mongoloides’. Receosos, os pais em sua
maioria optavam em matricular os filhos nas escolas especiais. Eles achavam de
maneira errônea que ao restringir o contato das crianças aos deficientes as
chances de adaptação eram maiores.
Contrariando esta tendência, o médico psiquiatra José Robério, de 72
anos, e a advogada Margarida, 71, pais de Débora não imaginaram outra escola
para a garota, se não a regular. Foi assim por toda a vida escolar, nem sempre
fácil. Ainda na educação infantil, Débora lembra de ter sido chamada de
'mongol' por um garoto. Ela chorou, ficou magoada, mas encontrou na professora
uma aliada que explicou à classe que 'mongois' eram os habitantes da Mongólia e
ainda ensinou as crianças o que era a síndrome de Down.
'Amor se sobrepõe'
A mãe relata: "Nunca cogitei uma escola especial
porque Débora era uma criança comum. A escola especial era discriminatória e
ela precisava de desafios. Não sabia muito bem como seria, mas estava aberta
para ajudar minha filha a encarar qualquer coisa". Engajada na causa, em
1983, Margarida fundou a Associação de Síndrome de Down, em Natal, com o
objetivo de conscientizar a população e batalhar pelo fim do preconceito.
"Quando eu soube que Débora tinha Down foi como seu eu tivesse
virado do avesso. A perspectiva era tenebrosa, não havia informação, mas o amor
se sobrepõe a qualquer deficiência", afirma Margarida. "Criamos a
Débora desprovida de total preconceito, sempre a tratei igual ao meu filho mais
velho [Frederico, advogado, de 33 anos], o assunto nunca foi tabu. Ela é uma
moça como qualquer outra, sonha, deseja, tem planos, é descolada e bem aceita
em qualquer ambiente."
Por conta de sua experiência com professora, Débora já foi convidada
para palestrar em várias partes do país e até fora dele, como Argentina e
Portugal. Sempre que pode participa de iniciativas para ajudar a combater o
preconceito. “Ainda existe e acho que as palestras ajudam a diminui-lo. Muitos
professores foram assistir minhas palestras e fui aplaudida em pé pela
plateia.”
No dia 21 de março quando se comemora o Dia Internacional da Pessoa com
Síndrome de Down, Débora vai apresentar uma peça de teatral junto com outros
professores da Escola Doméstica de Natal para explicar o que é a síndrome aos
alunos. Ela fez aulas de teatro por três anos. Outro plano é lançar um livro de
pequenas fábulas, todas de cunho moral que abordam a inclusão.
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